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Pesquisadora Letícia Cardoso propõe método para estudar culturas populares

Publicado em: 11/09/2020

Publicado originalmente em 09/11/20, no site Ciência UFMA.

IMPERATRIZ - Segundo o Dicionário Online de Português, “pesquisar” significa “investigar, com a finalidade de descobrir conhecimentos novos; recolher elementos para o estudo de algo”. Mas, para a professora permanente do PPGCom de Imperatriz, Letícia Conceição Martins Cardoso, a prática da pesquisa vai além disso, constituindo-se numa ação de transformação social.

A trajetória de Letícia Cardoso envolve as graduações em Letras (UEMA) e Jornalismo (UFMA), Mestrado em Ciências Sociais (UFMA) e Doutorado em Comunicação (PUC-RS). “Ingressei num curso de Direito que eu não concluí. Eu desisti porque entrei logo no Mestrado em Ciências Sociais, e meu interesse foi para a área de pesquisa. Fui estudar as relações entre a política local, a política maranhense e a cultura popular, que era uma temática que eu já havia desenvolvido num curso de especialização em Jornalismo Cultural. E na própria graduação, eu também fiz o TCC sobre esse tema, a questão da cultura popular no Maranhão, numa perspectiva da comunicação. Então, digamos que é a temática da linha mestra da minha vida acadêmica”, explica. 

Contribuição na área

No doutorado, a pesquisadora desenvolveu uma metodologia para estudar as culturas populares sob a óptica da comunicação, que vem aplicando em seus estudos com vários grupos de cultura popular. Conforme Cardoso ressalta, o interessa não é somente pelos grupos de cultura tradicional, como Bumba meu boi e Tambor de crioula, por exemplo, mas também a cultura de rua, como hip hop, rock, reggae.

“Eu desenvolvi uma proposta de método para ser aplicado às culturas populares, ou seja, como enxergar, como entender, como descrever as instâncias de produção, de circulação e de consumo dentro da cultura popular. Nós identificamos um grupo de cultura popular que gere interesse, que tenha alguma relação, um laço, um vínculo simbólico e/ou identitário com grupos, tanto em São Luís, como no interior do estado, e vamos pensar nesse grupo cultural, ou nesse artista, ou nessa banda, enfim, nessa manifestação, como um processo de comunicação”, explica a pesquisadora.

 E tratando especificamente das características da comunicação, Letícia Cardoso as explora nessa metodologia. “Todo processo de comunicação tem início – que é a sua lógica de produção –, tem uma circulação – que seria a distribuição dos produtos, como é que circula na mídia e como chega até o consumidor – e tem o campo do consumo. Nós vamos entender isso, mesmo que se trate do Bumba meu boi, do Tambor de crioula, de uma Festa do Divino Espírito Santo, ou de uma banda de rock ou street dance, enfim, nós pensamos as manifestações, as práticas culturais sob o ponto de vista desse processo de comunicação, que é algo circular, dinâmico. Toda prática comunicacional vai ter essas instâncias de produção, circulação e consumo”, pondera a pesquisadora. 

De forma geral, Cardoso ressalta que, com base na metodologia desenvolvida por ela, identificam-se as instâncias do processo comunicacional para se entenderem as relações com o campo político, institucional, com o mercado, com a sociabilidade das pessoas, com a comunidade, do que seria uma prática cultural por um olhar comunicacional. 

Pesquisas em andamento

Na pesquisa científica, Letícia Cardoso mantêm o projeto “Metodologias de Pesquisa em Estudos Culturais: um olhar comunicacional sobre as culturas populares no Maranhão”, que recebeu aprovação para financiamento pela Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (Fapema). Dentro desse projeto, há pesquisas que envolvem alunos e ex-alunos, orientandos pelo Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica (Pibic), mestrandos e quem tem interesse em participar das pesquisas que são atravessadas pela comunicação e cultura.

A professora orienta a pesquisa de Iniciação Científica intitulada “Vida e obra de César Teixeira: mediações na cultura popular no Maranhão”. Segundo Cardoso, a escolha pelo artista maranhense como tema de investigação se deu por conta da sua relevância no cenário cultural. “Ele faz essa mediação da cultura popular tradicional com a música da indústria cultural, mais erudita. Ou seja, uma apropriação que traz muitos ganhos à cultura popular, por isso nós escolhemos o artista César Teixeira para fazer esse estudo”, pontua.

Há, também, o trabalho que visa mapear os grupos de Bumba meu boi na Ilha de São Luís, inicialmente, mas que pode ser estendido para todo o Maranhão. De acordo com a pesquisadora, a ideia do mapeamento é identificar a localização da sede de cada grupo, líder, contato, além de fazer registro de imagens (fotos e vídeos), para construir um mapa digital e impresso que sirva de portfólio para esses grupos. “Esse trabalho é muito extenso, temos três integrantes do grupo de pesquisa que estão ajudando, fora professores que também colaboram, e são trabalhos vinculados à Iniciação Científica”, ressalta Cardoso.

E, ainda, quatro orientandos que estudam diferentes grupos de cultura popular, relacionando comunicação e cultura, sendo eles: Boi de Axixá, na perspectiva da comunicação; processo de comunicação do Tambor de Crioula de Mestre Felipe; processo de produção colaborativa da produtora Casa Loka; e representações da cultura popular no jornalismo local.

Quanto às produções, Cardoso indica a publicação do artigo “Hegemonia e contra-hegemonia na cultura popular do Maranhão” na Revista de Políticas Públicas, em 2018; artigo “Tambor de crioula como processo de comunicação: negociações contemporâneas”, no periódico Estudos em Comunicação, em 2019; trabalhos apresentados no XXI Congresso de Ciências da Comunicação na Região Nordeste – Intercom, na IX Jornada Internacional de Políticas Públicas – JOINPP, e no IV Simpósio Nacional de Arte e Mídia, todos em 2019. 

Mudanças na rotina produtiva

Sobre o impacto na produção de trabalhos pelo grupo de pesquisa em virtude da pandemia da covid-19, Cardoso reflete as alterações. “A pandemia acabou influenciando muito na rotina de trabalho, porque nós já tínhamos feito leitura, revisão bibliográfica, estudo de textos, reuniões para tirar dúvidas, para pensar nas ferramentas de coleta, nas formas de pesquisa de campo, e justamente a nossa maior tendência nesse tipo de estudo que fazemos é a pesquisa de campo, empírica, que requer contato com pessoas”, indica.

Entretanto a professora conseguiu fazer adaptações para manter as pesquisas ativas, e o tempo está sendo aproveitado para escrever a parte teórica dos trabalhos. “Apesar da pandemia, nós estamos fazendo reuniões quinzenais do grupo. Com os orientandos de TCC e orientandos de Iniciação Científica, nós nos reunimos uma vez por semana, dependendo da necessidade de cada um. Atualmente, eu oriento, em média, oito trabalhos, entre orientandos de TCC, Pibic e que são apenas ligados ao grupo de pesquisa”, explica Cardoso. 

Um dos problemas encontrados é em relação à pesquisa de campo, que precisou ser suspensa, em razão da recomendação de isolamento social. Conforme aponta, “a pesquisa de campo não pôde acontecer, nem mesmo por via on-line, ou por videoconferência, porque, em geral, os estudos são de cultura popular, cultura tradicional, e o contato com as pessoas é muito difícil".

Mesmo com as barreiras encontradas, a pesquisadora consegue aproveitar as ferramentas disponíveis para continuar o trabalho. Letícia Cardoso relata que a identificação das sedes dos grupos de Bumba meu boi em São Luís é feita por telefone. “Aproveitamos que não poderíamos ir até a sede, a casa dos líderes dos grupos de Bumba meu boi, e fizemos toda essa parte de identificação dos endereços e telefones. Ligamos para os líderes, corrigimos alguns erros de contato, porque pegamos previamente na Secretaria de Cultura, mas vimos que havia muitos erros de cadastro.” 

Baseada nesse trabalho de mapeamento, a professora alerta para o contexto social do Maranhão, que está empatado com o Piauí entre os estados brasileiros com menor acesso à internet, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2018.

Gráfico: Percentual de domicílios com acesso à internet no Brasil Fonte: PNAD (2018).

A pesquisadora Letícia Cardoso aponta suas percepções desse contexto. “Muitos dos líderes dos grupos de Bumba meu boi não têm internet em casa, essa é a realidade da população maranhense, ainda há uma exclusão digital muito grande. Essa realidade é bem mais visível quando se fala de cultura popular tradicional, porque os grupos estão em zonas rurais ou em zonas periféricas das cidades, em que a internet é muito ruim”. Apesar disso, foi possível telefonar para buscar as informações necessárias. “Nós acabamos não realizando esse trabalho on-line, remoto. Nós ligamos, conversamos, explicamos sobre a pesquisa, que teve de dar um tempo”, explica. 

Por outro lado, foi possível utilizar a internet com a fonte de outra pesquisa a que possuía acesso, ou seja, Cardoso teve de adaptar as ferramentas de coleta de dados conforme o mais adequado. “Quanto a César Teixeira, nós fizemos a atividade remota, com videoconferência e questionário on-line, mas avisamos ao informante que queremos a entrevista, porque nada substitui o contato pessoal”, reflete. 

Aprendendo com a pandemia

A rotina de trabalho específica da professora Letícia Cardoso foi modificada, já que as aulas presenciais não estão acontecendo, e as aulas remotas ainda não começaram. Contudo o Observatório de Experiências Expandidas em Comunicação (OBEEC), grupo de pesquisa de professores do Departamento de Comunicação o qual Cardoso integra, realiza atividades remotas extracurriculares que não prejudiquem os alunos sem acesso à internet. “Decidimos não ministrar aulas e passar atividades curriculares, para que os alunos que não têm acesso à internet não sejam prejudicados, mas estamos realizando atividades extracurriculares, que possam trazer conteúdos interessantes”, pontua. 

Para a docente Letícia Cardoso, é essencial entender o funcionamento das ferramentas digitais. “Principalmente professores, a pandemia nos mostrou a necessidade de estarmos habilitados a manusear as tecnologias de uma forma criativa, que possa colaborar cada vez mais nos trabalhos e nas pesquisas, e no contato com os alunos. Estamos vendo como a internet tem sido importante para manter o contato com as pessoas de que a gente gosta, com os colegas de profissão, para possibilitar as reuniões de trabalho, e lamentamos que esse acesso ainda não seja democrático”, pondera. 

Ao mesmo tempo que reflete sobre a relevância das ferramentas digitais, Cardoso chama atenção para os problemas sociais que ultrapassam a utilização da internet como facilitadora das situações durante a pandemia. “Nós precisamos nos beneficiar da tecnologia, mas, ao mesmo tempo, precisamos deixar uma crítica, não podemos esquecer a realidade social que vivemos, e pensar que tudo vai ser resolvido pela tecnologia. Nós temos sérios problemas sociais, econômicos, desigualdades, que não vão ser substituídos pela tecnologia de imediato. Então, a internet é uma grande ferramenta, mas a vejo também de uma forma moderada, sem muito entusiasmo, principalmente no contexto socioeconômico que vivemos, em que as pessoas precisam preencher questões básicas de alimentação e moradia como um primeiro plano, e não tèm condições de pensar em internet ou em lazer, então essas questões precisam ser ditas e colocadas”. 

Financiamento da pesquisa

Apesar de ter sido contemplada no Edital Universal da Fapema, a pesquisa coordenada pela professora Letícia Cardoso não recebe recursos financeiros, o que dificulta o andamento de algumas atividades necessárias para a efetivação dos trabalhos. “Nós desenvolvemos o projeto da forma que é possível, muitas vezes precisamos repensar e redimensionar as atividades, porque, sem recursos, há coisas que realmente não temos condição de fazer. Por exemplo, o mapeamento dos grupos de Bumba meu boi, sem o financiamento público, eu não tenho condições financeiras para imprimir muitos mapas e distribuir no estado. Também não vou conseguir fazer um site de qualidade, que carregue imagens e vídeos. Dá para fazer a pesquisa de campo, as leituras bibliográficas, as entrevistas, mas há coisas que chegam no nosso limite, e isso vai atrapalhar o desenvolvimento da pesquisa”, critica. 

Para Cardoso, é importante que a realidade vivenciada por pesquisadores e pesquisadoras no Brasil seja mostrada à comunidade em geral. “Fazemos pesquisa por devoção, por teimosia, por querer fazer o melhor que podemos na nossa área. Nós temos um financiamento que é meramente formal, ele não existe. É preciso demarcar e reivindicar, aproveitar esses momentos de visibilidade para esclarecer, porque muita gente pensa que estamos recebendo dinheiro, financiamento público, e não produzimos, mas é ao contrário, nós produzimos muito sem receber o financiamento com o qual fomos contemplados.” 

A professora entende a pesquisa como uma ação capaz de promover a transformação social, especialmente dos alunos e alunas participantes dos projetos. “Precisamos repensar a realidade, porque o pesquisador muitas vezes trabalha por conta própria, tirando do bolso, fazendo por acreditar na ciência, por acreditar que sua pesquisa é uma ação de transformação social. Esse é um dos motivos por que eu faço pesquisa, eu gosto, não só por gostar de pesquisar, de ter essa empatia com a temática que eu trabalho, que é a cultura popular, mas também porque eu vejo que os alunos que se aproximam da pesquisa se transformam também”, pontua. 

Cardoso complementa sobre como a pesquisa estimula os alunos e as alunas a crescer. “Eles começam a repensar o seu contexto, ler mais, ficam mais autônomos, partem para fazer mestrado, publicar textos, estudar mais na sua área. Com a prática da pesquisa, há uma semente que é plantada e dá muitos bons frutos, só que isso é um trabalho silencioso, muitas vezes anônimo. Quase não temos divulgação, visibilidade, a não ser dentro da academia, mas fora, a mídia científica é muito limitada, pouco se sabe do que é produzido nas universidades, e é produzido quase que de uma forma voluntária”, reflete a pesquisadora. 

Recomendações para pesquisar durante a pandemia

Para auxiliar quem está pesquisando durante o período da pandemia, Letícia Cardoso indica que é importante pensar na saúde física e mental, e tentar adaptar o que for possível. “Não podemos nos arriscar para fazer pesquisa de campo e entrevista para entregar no prazo. Tem que pensar em si, na questão humana. Não dá para colocar trabalho em primeiro lugar, o trabalho está acontecendo como pode acontecer”, pontua. 

Sabendo que há pessoas que ficam preocupadas com o bem-estar dos familiares, o que pode comprometer a rotina de trabalho, a professora indica que é importante tentar manter o equilíbrio entre a saúde física e mental. Se possível, desenvolver algumas atividades em casa. 

“Caso tudo esteja ocorrendo bem, dá para pensar no trabalho de casa, home office, e temos que ter disciplina, reservar um horário específico para o trabalho, se não talvez não aconteça. Mas também, se não acontecer como esperamos, que a gente não se cobre tanto, afinal esse período é muito difícil para todos, e se estamos com dificuldade, podemos ter certeza de que os colegas também estão”, defende.

Em relação ao contato remoto com as fontes da pesquisa, é necessário também saber lidar com sensibilidade. “Os informantes da pesquisa, os possíveis entrevistados, todos estão passando por essa crise juntos. É preciso ter empatia, solidariedade, compreensão com o outro, e isso ainda está faltando muito”, reflete Cardoso. 

Saiba mais:

E-mail: leticia.cardoso@ufma.br

Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/6186532880175192

Artigo “Hegemonia e contra-hegemonia na cultura popular do maranhão”, disponível em: http://www.periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/rppublica/article/view/9811

Artigo “Tambor de crioula como processo de comunicação: negociações contemporâneas”, disponível em: http://www.periodicoseletronicos.ufma.br/index.php/cambiassu/article/view/13147


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Revisão: Jáder Cavalcante

Lugar: Câmpus Imperatriz
Fonte: Nayara Nascimento/Ciência UFMA
Última alteração em: 13/09/2020 22:21

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