Palavra do Reitor
No famoso romance O Leitor, do escritor alemão Bernhard Schlink – que foi adaptado às telas com a atriz Kate Winslet, ganhadora do Oscar em 2009 por esse trabalho –, um drama se instala a partir do analfabetismo da personagem Hanna, que, envergonhada dessa condição, sofre consequências terríveis.
Assim como ela, milhares de maranhenses enfrentam o drama diário de se sentirem excluídos de um mundo de possibilidades que a leitura proporciona, seja no aspecto pessoal, seja no profissional. Os números de 2011, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram o quanto o nosso Estado precisa avançar mais nessa luta, pois revelam que ainda existem aqui cerca de um milhão de analfabetos. De acordo com esses dados, entre as cidades com o maior número de analfabetos no Estado estão Belágua (36,64%), Marajá do Sena (36,58%), São João do Sóter (36,04%) e Aldeias Altas (35,1%).
São números alarmantes, principalmente quando se sabe que, aliado ao analfabetismo, invariavelmente está presente a pobreza. Não por acaso, o presidente da Assembleia Legislativa do Estado/MA, deputado Arnaldo Melo, citou em seu discurso, na sessão solene de abertura dos trabalhos legislativos, no último dia 4 de fevereiro, que “(...) não podemos mais suportar que a região leste, que não é diferente das outras, mas se agrava um pouco mais na regional de Caxias, que abrange São João do Sóter, Caxias, Aldeias Altas, Afonso Cunha, Coelho Neto, naquela região, enfim, que tenhamos mais de 71% do nosso povo rural na extrema linha de pobreza recebendo menos de R$ 70,00 por mês”.
Diante desse quadro, a UFMA – fiel à sua missão de ser uma instituição inclusiva e preocupada com as grandes questões que dizem respeito ao crescimento de nosso Estado – irá lançar, no próximo dia 18, o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (PNAIC), com a participação também de representantes dos governos Estadual e Municipal. A iniciativa do Pacto partiu do Ministério da Educação, que estabeleceu como meta que o Maranhão alfabetize todas as crianças até os oito anos de idade que estejam no terceiro ano do ensino fundamental.
Os detalhes do lançamento do evento foram acertados durante a semana que passou, numa grande reunião realizada na reitoria da UFMA, na qual o secretário de educação estadual, Pedro Fernandes, declarou à ocasião que o Maranhão ainda tem 19,1% de analfabetos e que sua meta é reduzir esse índice para 9,1% até 2015.
Quanto ao Pacto, cabe destacar o papel dos professores da UFMA que atuarão na formação dos professores orientadores. São estes que terão a responsabilidade, numa segunda fase, para capacitar os formadores que vão desenvolver as atividades de ensino nos moldes atualizados do processo de ensino-aprendizagem.
No Maranhão, o PNAIC envolve 6 (seis) polos: Imperatriz (34 municípios), São Luís (43 municípios), Pinheiro (42 municípios), Caxias (17 municípios), Presidente Dutra (32 municípios) e Bacabal (33 municípios). Os números são gigantescos: estarão envolvidos 938 professores orientadores e 32 professores formadores para alfabetizar 22 mil e 571 alunos de 201 municípios maranhenses.
Afora esse grande pacto, a UFMA trabalha ainda com a formação dos professores do ensino básico e com os programas PARFOR, Educação no Campo, PRONERA e PROEB. Em seis câmpus – São Bernardo, Bacabal, Pinheiro, Codó, Grajaú e Imperatriz –, nas mais diversas licenciaturas, com duração de dois e quatro anos, já alcançamos quase mil alunos em capacitações que envolvem as ciências da natureza, ciências humanas e linguagens, códigos e suas tecnologias.
Temos a preocupação ainda de inserir os nossos Professores Doutores nas realidades de cada uma dessas regiões, valorizando o modo de viver e a cultura de sua gente. Desenvolvemos, em parceria com o IPHAN, uma formação que abrange duas turmas de professores em Alcântara, que já vai para o terceiro ano, da 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental, cujo foco é a identidade cultural, que beneficia a região com melhoria da autoestima de seus moradores, gerando ainda oportunidade de emprego e renda.
Trata-se de um projeto ímpar no Brasil, pois estimulamos as crianças a conhecerem mais de sua realidade e a valorizá-la com cartilhas educativas, preparadas por uma equipe multidisciplinar de professores das áreas da Sociologia, Arte, História e Geografia.
Os dados aqui já expostos e avaliados na reunião para o Pacto que será lançado precisam ser vistos à luz do momento pelo qual passa o país e mais precisamente o Maranhão. Mais do que nunca, a educação foi tão necessária como insumo primordial ao desenvolvimento. Vivemos, ao mesmo tempo, a era industrial plena e a pós - industrial. Em ambas as situações, pede-se um tipo particular de trabalhador, aquele que mais adquiriu experiência em sua formação acadêmica. O prejuízo social e econômico, que a situação do analfabetismo maranhense causa, terá repercussões por gerações, se não for enfrentado agora.
Fala-se em apagão de mão de obra no país, e este é um dos mais perversos “Custo Brasil” que se pode relacionar, mais graves que os estruturais e fiscais, dos quais se fala tanto. O Maranhão vive um período de descobertas de gás e petróleo, xisto e ouro, explorações que tendem a, em poucos anos, se estabelecerem numa cadeia industrial extensa, catalisadora de investimentos em grande proporção, ampliação da infraestrutura das cidades, promotora do desenvolvimento de serviços com grande geração de empregos.
Acredito que o Pacto é um bom começo, pois uma sociedade em que inexistam analfabetos é o sonho de todos aqueles que amam e valorizam a educação, e deve ser o alvo do máximo de instituições no Estado, por vários anos, independente das mudanças políticas e democráticas naturais e necessárias em suas administrações.
Doutor em Nefrologia, reitor da UFMA, membro do IHGM, ACM e AMC
Publicado em O Estado do Maranhão em 10/02/2013
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